sexta-feira, 20 de abril de 2012

Transformações na foz do Rio Marinho após a instalação da Vale

Vista da Ilha do Príncipe e foz do Rio Marinho anos 1930 (final)  In http://legado.vitoria.es.gov.br/baiadevitoria/
Foto site Baia de Vitória. http://legado.vitoria.es.gov.br/baiadevitoria/
Vista da Ilha do Príncipe e foz do Rio Marinho anos 1940 In http://legado.vitoria.es.gov.br/baiadevitoria/
Revista Capixaba
Vista da foz do Rio Marinho cerca 1960 após a instalação da Vale. Da Revista Capixaba. Pesquisa Gabriela Teixeira

quinta-feira, 12 de abril de 2012


Abaixo assinado em prol do Tombamento do Ofício dos Catraieiros da Baía de Vitória, ES.

“Nós abaixo assinados, considerando que:

1 – A atividade desenvolvida pelos Catraieiros da Baia de Vitória é um dos trabalhos manuais mais antigos do Estado do Espírito Santo, servindo para o transporte de passageiros e cargas através do canal de Vitória e compondo a paisagem e o cotidiano da ilha desde os primórdios da colonização capixaba.
2 – Que a Constituição Federal, na instituição de nosso Estado Democrático de Direito, estabelece que:
Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:
I - as formas de expressão;
II - os modos de criar, fazer e viver;
(...)
§ 1º - O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação.
(...)
§ 4º - Os danos e ameaças ao patrimônio cultural serão punidos, na forma da lei.

3 – Que o valor social do trabalho constitui-se como um dos fundamentos de nossa República.
4 – Que os Catraieiros da Baia de Vitória foram deslocados de seu local de atuação para a realização das obras de ampliação do Porto.
5 – Que esse deslocamento tornou a travessia mais longa, perigosa e demorada, trazendo aos catraieiros prejuízos materiais, com significativa diminuição de suas rendas, e também aumento do desgaste físico, impactando assim sobre a saúde dos trabalhadores.
6 – Que já foi encaminhado ao IPHAN documentos para o tombamento da atividade catraieira como Patrimônio Cultural Imaterial.
7 – Que os catraieiros cumprem uma função que o Estado ignora, que é a implantação do transporte hidroviário em cidades com potencial para desenvolver este sistema.
8 - Que o processo de licenciamento ambiental das obras de expansão do Porto cita “conflito de uso” entre a atividade catraieira e a ampliação portuária, “pois a manutenção dessas atividades depende diretamente do acesso ao canal da Baía de Vitória”. Desse modo, se prevê a “inviabilização da atividade desenvolvida pelos catraieiros no mesmo local”.

Vimos demonstrar apoio à manutenção da atividade secular dos catraieiros, em espaço e condições de trabalho adequados.

Acreditamos que o crescimento da cidade deve considerar o bem estar e a dignidade de seus habitantes, suas práticas e meios de existência.
Por isso, somos a favor do tombamento do trabalho dos catraieiros da Baia de Vitória como Patrimônio Cultural Imaterial e a adoção imediata de medidas que garantam a realização digna desse ofício tradicional que se encontra em situação de grave ameaça frente às obras de expansão do Porto de expansão do Porto de Vitória."

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Tradição ameaçada - gazeta online

Tradição ameaçada - gazeta online
A revitalização do cais comercial de Vitória ampliará o pátio de cargas de 26 mil metros quadrados para 40 mil metros quadrados, com a demolição de galpões do porto; e ainda, com o aterro de 22 metros em largura e 100 metros em comprimento sobre a baía, incluindo o espaço utilizado pelos catraieiros desde 1940.
O relatório de impacto do Iema, O Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos, constata a inviabilização da atividade desenvolvida pelos catraieiros; ainda, prevê a interferência temporária no uso do canal por embarcações pesqueiras e possíveis abalos ao entorno. O Iema estabelece condicionantes para amenizar a situação da população impactada, que deveria ser convocada para reuniões que a informasse sobre o projeto, a fim de realizar as adequações sugeridas por suas entidades representativas.

O fato é que a maior obra portuária desde a construção do Cais de Capuaba, divulgada em 2010, vinha passando despercebida pela opinião pública. Com a manifestação de insatisfação por parte dos catraieiros, o impasse se expõe no que se refere ao deslocamento do seu antigo ponto que torna seu percurso mais lento e perigoso. Os catraieiros cederam todo o espaço ocupado desde o século XVI para as atividades portuárias modernas.

Constituem remanescentes de ofício tradicional, com processo de tombamento como bem imaterial, sob o respaldo de direitos humanos de população tradicional (Convenção 169 OIT). A atual situação dos catraieiros deve ser revista pela autoridade portuária. Afinal, cumprem uma função que o Estado ignora: a implantação do transporte hidroviário em cidades com potencial para desenvolver este sistema. Por fim, advém uma questão: quanto tempo de sobrevida comercial do Porto de Vitória justifica a perda de uma atividade histórica e a impossibilidade da reimplantação do sistema de transporte hidroviário na Baía de Vitória?
Clara Luiza Miranda é professora do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Ufes

Nota:
Quando escrevi esse artigo (3 semanas antes de ser publicado) não tinha acesso ao projeto de revitalização do Cais Comercial de Vitória, berços 1 e 2, apenas noticias de jornais on line em que se disponibilizava links para videos do youtube, que dão a entender que os galpões seriam derrubados. No projeto que tive acesso, obra licenciada em andamento até dezembro de 2012,  não consta demolição dos galpões.

Renitentes da cidade


Renitentes da cidade
O enredo do filme Up- Altas Aventuras, Pixar, dirigido por diretor Pete Docter (seu primeiro foi Monstros S.A.), conta as aventuras que Carl (um idoso viúvo) Com o passar dos anos a cidade cresce em volta da casa de Carl, mudando totalmente a escala. Carl se recusa a vendê-la para a construção de mais um prédio. Depois de uma desavença com um trabalhador da construção civil, o tribunal ordena Carl a se mudar para um asilo. Ele quer manter a promessa de Ellie (sua esposa), e realizar o sonho de ambos, então inventa um esquema com seu velho material profissional para criar um dirigível improvisado com milhares de balões de gás, que arranca a casa fora de suas bases para sair flutuando céu afora.
Há também a história de resistência de Jonathan Zimmermann (Bruno Ganz) moldurista que resiste à expansão da retroárea do poderoso Porto de Hamburgo. Mas a história não tem a ver com isso ver filme de Wim Wenders, de 1977, baseado na história Ripley's Game de Patricia Highsmith.
Casa de Carl e Atracadouro do catraeiros em Paul, Vila Velha.

Assim como o personagem Carl e a família de Jonathan, os catraeiros tem resistido ao crescimento do porto de Vitória e de Vila Velha, e ainda às novas instalações de equipamentos da Petrobrás com tanques alcool e outros combustíveis. É  uma longa história de resistência e permanência no espaço (quase 500 anos).
O video abaixo [talvez] especulativo apresenta os planos futuros (?) da Codesa, Porto de Vitória para o centro da cidade. Nenhum edifício do porto fica de pé, inclusive o Armazém 1, já tombado pelo patrimônio (estadual ou federal). Há indicação de ampliação da Av. Beira Mar, o que sugere articulação para implantação do BRT. De modo que a cidade fica atrás do porto como sempre nem espaço para os catraeiros nem espaços culturais...

Revitalização do Porto de Vitória.mp4

Porto de Vitória - Dragagem e Ampliação do Cais Comercial

Moradores [de Vila Velha] vão poder opinar sobre PDM - gazeta online

Moradores vão poder opinar sobre PDM - gazeta online

O novo Plano Diretor Municipal (PDM) de Vila Velha, aprovado em setembro de 2011, será discutido com a população e, se necessário, passará por alterações. Os debates serão feitos por determinação da Justiça, já que a proposta original não teria sido apresentada aos moradores do município em audiências públicas.

O plano, que amplia a área urbana da cidade, foi suspenso no início deste mês pelo Tribunal de Justiça do Espírito Santo. O pedido foi feito pelo Ministério Público Estadual, que entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, alegando que a mudança representava um retrocesso em relação à questão ambiental.

O pedido do MP foi acatado pelos desembargadores, que consideraram que a nova lei infringia os interesses de proteção ambiental e da democra cia, já que as audiências públicas não teriam sido realizadas. Com isso, todas as alterações feitas estão canceladas.

Com a suspensão do novo PDM, o município passou a adotar o plano antigo, aprovado em 2007. Com isso, ficam impedidas as reduções de áreas ambientais, como as dos morros do Moreno e de Jaburuna e do Parque de Jacarenema.

Também foram proibidas a criação de dez novas áreas industriais, da Zona de Interesse Turístico, do Centro de Convenções e do Porto Público de Águas Profundas, o superporto.

O secretário de Desenvolvimento Urbano de Vila Velha, Henrique Casamata, garantiu que, durante a elaboração do plano, foram realizadas, pelo menos, cinco reuniões e três audiências públicas com representantes de vários setores da população. Casamata também afirmou que o município vai cumprir as exigências impostas pelo Ministério Público.

"Vamos cumprir tu do que a Justiça determinar, mas a nossa preocupação é quanto tempo esse processo vai levar. Vamos procurar o Ministério Público e tentar estabelecer um prazo para realização das audiências públicas. O município precisa desse PDM para atrair empresas e desenvolver Vila Velha", diz.
(ver link)

Projetos suspensos até nova discussão com a população


Superporto
O PDM aprovado em 2011 previa o Porto Público de Águas Profundas, o superporto, que seria construído na área entre Interlagos e Ponta da Fruta

Condomínios empresariais
O novo PDM prevê a criação de 12 condomínios, espaços que reúnem empresas do mesmo setor: oito na Rodovia ES 388 e dois às margens da Rodovia do Sol

Zona de Turismo
Também previa uma Zona de Interesse Turístico na Região 5, com hotéis, bares, restaurantes, teatro, centro de comércio e outros serviços turísticos

Centro de Convenções
Outro projeto era o do Centro de Convenções, às margens da Rodovia do Sol. Serão 18 mil metros quadrados, com garagem, teatro e área de exposições

Proteção ambiental
O novo PDM também altera algumas áreas de proteção ambiental do município

Observações sobre o processo de licenciamento ambiental emitido pelo IEMA para a obra de ampliação do Porto de Vitória

Observações sobre o processo de licenciamento ambiental emitido pelo IEMA para a obra de ampliação do Porto de Vitória :
Leitura feita por Marcos Djavan na sede o IEMA, Jardim América, Cariacica.

Existe manifestação positiva da PMV, atestando que o projeto está de acordo com o PDU (Lei Municipal 6.705/06) e dentro da Zona de Equipamentos Especiais (arts. 109 a 111 do pDU).

No parecer técnico realizado pelo IEMA temos as seguintes observações/previsões:

Interferência das obras na circulação e no acesso ao canal no Município de Vila Velha, em cuja área portuária será instalado o canteiro de obras do empreendimento.

O local de atuação dos catraieiros é área de influência direta do empreendimento, e será sua área futura.

As vibrações poderão agravar fundações e estruturas utilizadas para aterro no passado.

Os catraieiros atuam por décadas no local em que se dará a ampliação do Porto, “verificando-se assim um conflito de usos, pois a manutenção dessas atividades depende diretamente do acesso ao canal da Baía de Vitória”. Prevê-se a “inviabilização da atividade desenvolvida pelos catraieiros no mesmo local”.

Não foi feita nenhuma observação para o perigo de “abalo nas edificações”, perigo enquadrado na categoria de severidade III.

Interferência temporária para uso do canal por embarcações pesqueiras.

Entre as condicionantes do projeto constam:

cronograma físico;

localização e layout do canteiro de obras;

plano de gerenciamento de resíduos sólidos;

forma de abastecimento e recolhimento de resíduos oleosos.

Monitoramento do transporte sedimentar;

Programa de gerenciamento de riscos;

Sistema de drenagem e de tratamento de efluentes;

Transporte de partículas sólidas;

Monitoramento granulométrico;

Contenção de compostos químicos;

Providencias para limitação de ruídos;

Monitoramento de áreas sujeitas a vibração e os mitigantes adotados;

Alternativa locacional para os catraieiros feito junto à associação, com anuência da PMV. Está condicionante, consta como atendida, em face da apresentação do ofício CA/COMAMB/008 n//]6281/09.

Foi emitida licença prévia de 1460 dias, datada de 21/07/09.


Catraieiros ganharão novo deck

Catraieiros ganharão novo deck com mais conforto e segurança
Artigo publicado no site da Codesa dia 07 de Outubro de 2011
O projeto de engenharia do novo deck dos catraieiros está pronto. Executado pela Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa), a pedido da Prefeitura Municipal de Vitória (PMV), o projeto apresenta a nova estrutura para os catraieiros com 80 metros quadrados, oferecendo mais conforto e segurança no embarque e desembarque de passageiros. A nova instalação estará em funcionamento no final do primeiro semestre de 2012, antes da conclusão das obras de ampliação e contenção dos berços 101 e 102 do Cais Comercial de Vitória.
O deck vai ficar ao lado do ponto atual dos catraieiros (barqueiros que fazem o transporte de passageiros em pequenas embarcações), nas proximidades do Porto de Vitória. Pessoas utilizam diariamente as catraias (como são chamadas os barcos) como meio de transporte ou para turismo entre o Centro de Vitória e Paul, em Vila Velha. A nova estrutura visa dar segurança e conforto aos passageiros, e melhores condições de trabalho aos catraieiros.
Conforte e segurança
Construído em madeira e sobre um flutuante, o deck terá área de aguardo para os usuários com bancos, cobertura em toldo e gradil lateral. “O local oferecerá mais conforto e segurança aos passageiros. Ficando sob um flutuante, que permite sua adequação às condições de maré, a instalação permitirá, por exemplo, acessibilidade aos deficientes físicos, que o ponto atual dos catraieiros não oferece. Assim, além de conforto e melhora no acesso, a estrutura possibilitará maior segurança aos usuários e aos próprios catraieiros, que terão ainda melhores condições de trabalho”, sublinha Mário Emílio da Silva, coordenador de Meio Ambiente da Codesa.
Nos 80 metros de área da nova estrutura haverá uma rampa com 20 metros de comprimento, ligando o ponto de entrada e saída até a chegada às catraias. A rampa é necessária para acompanhar o movimento de sobe e desce da maré. O novo deck será instalado cerca de 40 metros da estrutura atual, ficando o embarque de passageiros em frente à Praça Pio XII, com os barcos ancorando alguns metros em direção ao norte.
O posicionamento das catraias naquela posição será provisório, até que as obras de ampliação do berço 101 estejam concluídas. Finalizado este serviço, o deck terá sua posição invertida: o embarque continuará sendo feito nas proximidades da praça, mas as catraias ficarão posicionadas a uma distância de apenas 10 metros da escada que atualmente serve de base para os catraieiros.
“Os catraieiros só deixarão a estrutura atual após a conclusão da obra do novo deck, o que vai ocorrer no final do primeiro semestre do ano que vem. Já as obras de reforma e ampliação do Cais Comercial de Vitória ficarão prontas em dezembro de 2012”, pontua Mário Emílio.
Condicionante
O projeto do deck atende a condicionante nº 07 da licença de instalação nº 045/2010 concedida pelo IEMA (Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos), que se refere às obras do Cais Comercial de Vitória. A condicionante determina que a Codesa apresente o projeto descritivo e executivo da estrutura do novo deck, definido em conjunto com a PMV, e “implante-o antes do início da desmobilização do antigo ponto dos catraieiros”.
Seguindo a determinação da mesma condicionante, a Codesa vem se reunindo mensalmente com as entidades identificadas pelo IEMA na Área de Influência Direta (AIF) do empreendimento, informando sobre o projeto e fazendo as adequações sugeridas pelas entidades e pela PMV. O resultado desses encontros é registrado em Ata e encaminhado ao IEMA.
O IEMA identificou as seguintes entidades situadas na AID, que são convidadas para as reuniões: Associação dos Catraieiros da Baía de Vitória, Colônia de Pescadores Z-05 Maria Ortiz, Associação dos Trabalhadores e Amigos da Baia de Vitória, Movimento Comunitário do Morro da Fonte Grande, Associação de Moradores do Morro do Moscoso, Movimento Comunitário do Morro da Piedade, Associação de Moradores do Rosário, Associação de Moradores do Parque Moscoso, Associação dos Comerciantes da Vila Rubim e Associação de Moradores de Santa Clara.
(Texto: José Carlos Mattedi – Assessoria de comunicação / ASSECS –
Abaixo o deck entregue aos catraeiros em 2012, segundo o responsável técnico pelas obras do porto, este é provisório, pois qundo as obras terminarem o ponto pode ser deslocado para um ponto um pouco mais próximo do antigo ponto (ocupado desde 1940, aproximadamente). No entanto, mesmo este não satisfaz as necessidades dos 17 catraeiros e seus 600 passageiros diários.
Renata Morelato foto

Foto Renata Morelato


Porto de Vitória versus catraeiros


Porto de Vitória versus catraeiros
Por Clara Luiza Miranda

Os catraeiros são barqueiros que conduzem catraias ‑ pequenas embarcações – transportando passageiros e mercadorias de pequeno porte. Eles estão na Baia de Vitória desde a colonização portuguesa, o porto também sempre esteve por ali. Há noticias que nos anos de 1630, o porto era um sucesso levando a produção de açúcar de cristãos novos. Sabe-se que no tempo da província os barqueiros e os trapiches asseguravam a sobrevivência da pequena produção agrícola e de outros gêneros comerciáveis da “Grande Vitória”. Os catraeiros estavam na base dessa sobrevivência e conviviam harmoniosamente com o porto. O Cais do Imperador alinhado à escadaria do Palácio Anchieta era um dos pontos de embarque e desembarque de passageiros mais movimentados; hoje faz parte do cais comercial.
Os catraeiros consistiam praticamente na única forma de transporte e translado entre Vila Velha, Cariacica e Vitória. Pelos relatos dos antigos habitantes e viajantes era intensa a circulação seja da produção seja da população através da Baia de Vitória. Com a inauguração da Estação Ferroviária Leopoldina em 1895 e da Estação Pedro Nolasco em 1905 foram os catraeiros que conduziram passageiros e suas bagagens.
No início do Século XX, a elite capixaba quis se desvencilhar do passado colonial, a arquitetura e a urbanização colonial foram postos abaixo. O engenheiro Serafim Derenzi dizia que Vitória foi “tipicamente uma cidade colonial portuguesa (...), que [teimava] em ignorar os princípios da arte de construir (...) e de viver. A geometria só apareceu com a república”.
A inclusão do Espírito Santo no mapa do desenvolvimento brasileiro ocorreu lentamente, a infra-estrutura desse progresso deveu-se à institucionalização do porto em 1906, a sua modernização 1924-40, a construção das pontes metálicas (1927-28); aos aterros sucessivos: 1906-1940 (porto comercial), 1951-54 (Esplanada Capixaba), anos de 1970 (Terminal Flexibrás e Vila Rubim). Contudo, relativamente ao porto fecharam a vista e a fruição coletiva ao mar de metade da frente aquática da região central de Vitória.
Os catrareiros, que antes ocupavam toda frente aquática portuária, reduziram-se a ocupar alguns pontos em Vitória e em Vila Velha. Eles ainda conviveram e sobreviveram ao extinto transporte hidroviário entre os anos de 1980 e 1990. Há alguns anos utilizam instalações precárias como atracadouro, embarque e desembarque. Até que em 2011-12, restaram espremidos em Paul entre o porto e novas instalações da Petrobrás, e no momento em Vitória, foram deslocados do ponto que ocupavam há cerca de 60 anos para um local que não agrada nem catraeiros nem seus 600 passageiros diários.
A autoridade Portuária do Porto de Vitória divulga desde 2010 (informações do site da Codesa ‑ Companhia Docas do Espírito Santo) projeto de revitalização do Cais Comercial de Vitória e ao alargamento/contenção de berços com expansão sobre a baía por 22 metros e na Avenida Beira Mar incluindo mais cem metros de comprimento em direção ao Edifício Fabio Ruschi. A autoridade Portuária anuncia que o “comprimento do cais comercial de Vitória passará dos atuais 356 metros para 456 metros. Além disso, o Porto ganhará novo calado, saindo dos atuais 7,7m para 12,5 m. (...). No tocante à área operacional, o pátio de estocagem e manuseio de cargas passará de 26.000 m² para 40.000 m². (...) a obra será executada pela Carioca Cristiani Nielsen Engenharia”. Citamos a empresa, pois passa a ser um ator dessa história.
Esse avanço de 100 metros do cais comercial inclui o espaço que os catraeiros vêm ocupando desde os anos 1940-50. Segundo informação da própria Autoridade Portuária como condicionante do IEMA (Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos) e solicitação da Prefeitura Municipal de Vitória. Descreve-se a decisão do IEMA que se refere as obras de revitalização do Cais Comercial de Vitória, citando excerto texto assinado por José Carlos Mattedi – Assessoria de comunicação / ASSECS.
“O projeto do deck atende a condicionante nº 07 da licença de instalação nº 045/2010 concedida pelo IEMA”. A condicionante determina que a Codesa apresente o projeto descritivo e executivo da estrutura do novo deck, definido em conjunto com a PMV, e “implante-o antes do início da desmobilização do antigo ponto dos catraieiros”.
O novo deck para os catraieiros sob responsabilidade da Codesa consistiria numa nova estrutura para os catraieiros com 80 metros quadrados, e ofereceria “mais conforto e segurança no embarque e desembarque de passageiros”. De acordo, com o site da empresa, este deck seria construído em madeira e sobre um flutuante para adequação as condições da maré. Segundo esse informe da Codesa: “a instalação permitirá, por exemplo, acessibilidade aos deficientes físicos, que o ponto atual dos catraieiros não oferece. Assim, além de conforto e melhora no acesso, a estrutura possibilitará maior segurança aos usuários”.
A Codesa expressa ainda que: “O novo deck será instalado cerca de 40 metros da estrutura atual, ficando o embarque de passageiros em frente à Praça Pio XII, com os barcos ancorando alguns metros em direção ao norte.”
As obras foram realizadas pela empresa Carioca e o deck entregue não corresponde de nenhum modo à descrição acima. É metálica, está aquém das dimensões, não obedece as especificações materiais, estruturais e arquitetônicas prometidas, também não oferece conforto aos passageiros. A travessia que antes era de 5 minutos (entre Vitória e Paul) se tornou mais lenta e perigosa para os passageiros e os 17 barcos. Com razão, os catraeiros se sentem muito prejudicados, sentem-se preteridos. Seus passageiros são garantia de seu sustento, tendem a diminuir dentro dessas novas condições.
Compreendemos que as obras no Porto de Vitória representarão uma sobrevida operacional e comercial, isso é sem dúvida positivo, mas tem que se suceder sem que haja prejuízo social. Uma disputa entre o porto e os catraeiros é desproporcional em termos de relação de força econômica.
Na nossa história os catraeiros tiveram que ceder todo espaço que antes ocupavam as atividades portuárias produtivas modernas. Os catraeiros são “cantados em prova e verso” pelos defensores da “identidade capixaba”. Sua atividade profissional é, inclusive, reconhecida como “bem imaterial” pelas instituições culturais estaduais: a Associação Estadual de Arquivologistas reuniu documentos para dar entrada para tombamento da atividade dos catraeiros no IPHAN ‑ Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, com apoio da Prefeitura de Vitória. É uma ação cultural importante, mas poderá ser tarde demais para os catraeiros e suas famílias, cujas necessidades são materiais e imediatas.
O episódio vivido pelos catraeiros pode ser situada como mais um, dentre tantos, desde a instalação das grandes empresas no estado, em que as comunidades locais vulneráveis são relegadas, colocadas em situação de precariedade: índios convertidos em aculturados; quilombolas e pequenos agricultores em sem-terra e sem teto; e trabalhadores vernaculares em desempregados.
Os catraeiros têm estado na Baía de Vitória em toda sua história. Não aceitamos o argumento do custo do progresso, das promessas de futuro. Como diz Simone Weil: o futuro não dá nada, nós é que o construímos. Decisões como esta levam questionar a qualidade de governança no que se refere ao modus operandi das políticas públicas, do modo como as decisões são deliberadas, ainda, no limite, a legitimidade das decisões sobre o bem comum.
Além de nos posicionar em favor de um maior respeito aos catraeiros, a nossa intenção é ressaltar que os cidadãos usuários de seu bom serviço, também se sentem prejudicados, desse que é o único remanescente de transporte hidroviário na Baía de Vitória. E que se constitui numa forma de transporte alternativo, não poluente; de custo acessível, além de tudo, rápido. Esta é uma forma de transporte secular, que cumpre uma função que o Estado ignora. A implantação de um sistema de transporte aquaviário em cidades com potencial para desenvolver este sistema, a Baía de Vitória é um desses casos. Isso constitui uma recomendação do Ministério das Cidades e do Fórum Nacional pela Reforma Urbana; lembramos que transporte é um serviço essencial e um direito.